Victor Belart
O estádio de São
Januário sofrerá uma grande reforma para sediar - em 2016 - as
disputas de um jogo com origem inglesa e praticado sobre a grama. Bola,
chuteiras e meiões completam o cenário das partidas. Se os elementos indicam um
esporte no qual o Brasil é pentacampeão,
na prática, o rugby nacional jamais chegou a disputar uma Copa do Mundo. Amadorismo e desconhecimento
do grande público marcam o cenário da modalidade responsável por uma das obras
de maior investimento entre as sedes para 2016.
A disputa do rugby
nas Olimpíadas era comum no início do século XX. O esporte figurou nos jogos de 1900 a 1924. A modalidade deixou de participar da festa
pelo então baixo índice de seleções inscritas no torneio. Paralelamente aos Jogos Olímpicos, o rugby passou a se
desenvolver mundialmente de forma lenta. Só em 1987 foi disputada a primeira
Copa do Mundo, mais de 100 anos depois do esporte ter sido criado.
Numa forma
semelhante ao que acontece no futebol com Brasil e Argentina, o rugby é
dominado por potencias europeias, mas divide espaço com os dois maiores países
de um continente no hemisfério sul. Austrália e Nova Zelândia, que têm seleções pífias no futebol, são verdadeiras potências
do rugby. Os dois países foram, inclusive, sede dupla do Mundial de 1987. A
partir desse primeiro torneio, o rugby passou a se desenvolver ao redor do
planeta de maneira mais integrada. O Campeonato Mundial ganhou força nas últimas décadas e atualmente os marcadores
de audiência do torneio só ficam
atrás da Copa Mundo de Futebol e das Olimpíadas.
Impressionados
com a força recente do rugby, os dirigentes do COI passaram a repensar a
inclusão do esporte nos Jogos Olímpicos. Com a saída do beisebol e do softbol ,
alguns membros da Federação tentaram
incluir o rugby no evento. Depois de
derrotado na primeira votação, o rugby conseguiu em 2009, o aval dos dirigentes do COI para
retornar às Olimpíadas. A reestreia do jogo está marcada para 2016, numa cidade
sem a menor tradição e interesse pelo esporte.
A confirmação do
retorno Olímpico do rugby se deu no mesmo ano em que o Rio
foi escolhido como cidade sede dos Jogos. Como o esporte ainda não estava
solidamente confirmado para 2016, o projeto de logística para realização das
partidas de rugby naquele momento não passou de coadjuvante. A partir daí, a
discussão sobre quem abrigaria o rugby no Rio passou a se dividir entre o
Estádio Olímpico, que já seria reformado para os Jogos, e São Januário,
octogenário estádio do Vasco.
Oficialmente, o rugby ainda não tem casa
definida pelo COI para 2016. Vascaíno assumido, o prefeito Eduardo Paes nunca escondeu o interesse de que a arena cruzmaltina abrigasse o esporte. Apesar de
ainda não ter sido confirmada pelo Comitê Internacional, a escolha de São
Januário como sede do esporte parece encaminhada.
De olho na visibilidade e em possíveis melhorias para seu estádio de futebol, o
Vasco sempre se mostrou a favor da realização dos jogos de rugby em sua casa.
Sem tradição nenhuma no esporte, o clube montou inclusive um projeto de
preparação para jovens atletas
visando as Olimpíadas.
Além do Vasco,
outros clubes de futebol como Corinthians e Portuguesa, junto de clubes de
pequeno porte como Alecrim e Galícia já apoiam o rugby. Apesar de fãs e patrocinadores defenderem que o rugby
vem tendo um crescimento estratosférico no Brasil, na prática o esporte ainda não
tem uma liga integrada. O país nunca participou de Copa do Mundo no esporte e
brigará pela primeira vaga em Londres 2015. A realização do mundial na capital
inglesa pode servir como compensação para os britânicos frustrados com a
ausência do esporte nas Olimpíadas desse ano.
O retorno do
Rugby aos Jogos Olímpicos foi confirmado justamente quando Londres se preparava
para sedear as Olimpíadas. Com isso, os ingleses sugeriram a inserção da
modalidade já em Londres 2012 como esporte de demonstração. A proposta levada ao COI motivou os organizadores
britânicos, que construíram seu EstádioOlímpico para 80 mil pessoas esperando um uso constante e divisão de
atividades entre atletismo, rugby e futebol. O COI vetou a participação
demonstrativa do esporte em Londres.
Como os clubes londrinos de futebol já possuem estádios próprios, a
arena Olímpica pode se transformar num caso clássico de elefante branco. Para
evitar que o estádio não caia no desuso, as autoridades britânicas já buscam
estimular a realização de partidas
de rugby no estádio.
Assim como
ocorre em Londres, a casa do rugby em 2016 abrigará o esporte através de incentivo
das autoridades locais. Em 114 anos de existência, o Clube de Regatas Vasco da Gama nunca havia investido na
modalidade antes da possibilidade de reforma em seu estádio para receber o
rugby olímpico. Motivado pela realização dos jogos em São Januário - e agora já
preocupado em ter o rugby em suas divisões de base - o Vasco enviou, em
outubro, representantes a Londres para
esclarecer dúvidas sobre o esporte e melhorar a estrutura de São Januário para
receber o rugby.
Diferente da
recém-construída Arena Olímpica de Londres, São Januário é um dos estádios mais
antigos do Brasil. Construído por comerciantes portugueses na década de 1920, o
estádio teve seu auge na Era Vargas,
quando o presidente populista discursava das sociais e era ovacionado por
brasileiros agradecidos pelas leis trabalhistas. Em 2000, o estádio
protagonizou um vexame nacional quando seu alambrado desabou por conta da superlotação em plena final de Campeonato
Brasileiro.
Em Londres, o
estádio Olímpico, que seria casa do Rugby, foi construído dentro do parque
Olímpico da cidade. No Brasil, se consolidado em São Januário, o tradicional
esporte inglês será vizinho da comunidade Barreira
do Vasco, que tem cerca de 2 mil habitantes estimados .
Apelidada com o nome clube vizinho, a comunidade no coração do bairro imperial
de São Cristóvão está ameaçada pelas
remoções urbanas para 2016. Graças ao rugby em São Januário, a Secretaria de
Habitação da Prefeitura já concebe a possibilidade de reassentamento de algumas moradias na região. Se seguir os moldes do
que vem sendo a estratégia de reordenação urbana do Rio, a brutalidade do rugby
como esporte de contato pode ser usada ao pé da letra, de uma forma bem menos
amistosa do que os Jogos Olímpicos dizem ser.